terça-feira, outubro 31, 2006


ABSTENÇÃO NO REFERENDO AO ABORTO “VAI SER FATAL OUTRA VEZ”
-DIZ D. JOSÉ POLICARPO EM ENTREVISTA AO DIÁRIO DE NOTICIAS


“A abstenção pode ser fatal outra vez.", é a convicção de D. José Policarpo alicerçada na sua constatação de que há muitos cidadãos com dificuldade em abordar o aborto.

Pela importância das palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa vamos transcrever a entrevista que deu ao DN.

Portugal vai votar um novo referendo sobre o aborto. A Igreja Católica vai fazer campanha?

A questão é fundamentalmente de consciência. As campanhas têm uma marca partidária e servem para convencer os votantes para a justeza da escolha de um projecto político. Esta é uma questão transversal. Se há pessoas que têm já uma posição completamente tomada, tudo leva a crer que há uma camada da população para quem a questão é dolorosa, incómoda. Se a campanha for motivada no sentido de um debate esclarecedor das consciências, não teria dúvida nenhuma em dizer que entro na campanha. Se a campanha se assemelha à anterior, a uma campanha partidária, penso que aí não é o meu lugar. Gostaria que as pessoas não perdessem a calma...

O ideal seria não haver campanha? Os cidadãos já têm uma convicção...

Não sou tão optimista. Há muitas confusões. Só podem ter uma posição absolutamente assumida quanto à legalidade da interrupção de uma vida no seio materno por duas razões: ou porque têm dúvidas sobre quando começa a vida ou porque não respeitam a vida. O processo é oculto, dinâmico e progressivo desde a fecundação ao nascimento. A medicina fez avanços extraordinários, mas há dúvidas. Em que momento começa a vida? Essa é uma questão que pode ser esclarecida.

A Igreja tem condições, num cenário em que a campanha seja movida pelos partidos, para fazer a sua sensibilização ou ficará de fora?

Estamos a tentar fazê-la. Há grupos de católicos, e não só, que têm uma posição clara, e esses sim têm o direito de se constituírem como grupos cívicos e fazer campanha.
O porta-voz da Conferência Episcopal afirmou há algum tempo que a campanha seria "dinamizada e coordenada pelos bispos de cada diocese". Isto faz sentido à luz das circunstâncias actuais e das decisões tomadas pelos bispos?Isso não foi uma decisão tomada. A maior parte dos grupos que se estão a organizar pelo "não" tem referências católicas e, nem sempre com um discernimento perfeito, pensam que nós devemos estar com eles na primeira linha desta luta.
A minha estratégia em Lisboa, que é comum a todos os bispos, não está gizada. A única coisa que fizemos foi decidir que um membro do conselho permanente - o bispo de Leiria, D. António Marto - acompanharia em nosso nome os representantes desses grupos, para não estarmos todos a receber as mesmas pessoas. É natural que ele tenha dado orientações. Isso não significa que seja o coordenador. É um diálogo pastoral. Todos têm o direito de falar e ouvir os nossos conselhos.

Isso acontecerá nos púlpitos das igrejas?

Não! Vai depender da arte e da discrição de cada sacerdote, mas não gostaria de ver os púlpitos das homilias de domingo transformados só em púlpitos de campanha pró- -vida. Não é aí que o esclarecimento faz mais falta porque os ouvintes das missas de domingo são aqueles que normalmente já têm a sua posição.

Que diferença vai haver em relação à campanha de 1998?

O que é que a Igreja aprendeu com o primeiro referendo?Firmeza doutrinal e um desejo de esclarecimento. A pregação é sempre doutrina da Igreja e é motivada pelos acontecimentos. É natural que quem está empenhado na campanha pelo "sim" tente neutralizar a influência da Igreja, que é a força mais notória pelo "não". Para os cristãos, é uma questão de fidelidade aos mandamentos.
Pode um católico considerar que uma vida humana não começa no embrião?

Não com justeza. Se me pergunta se há católicos que podem ter interpretações imperfeitas e superficiais daquilo em que acreditam? Há. O conceito de "pessoa" surgiu na teologia nos séculos III/IV curiosamente para definir as pessoas divinas. Pessoa define-se como sujeito de relação. Ninguém diz que no embrião está uma vida completa. Também não está no recém-nascido. A vida é um processo... Hoje toda a gente sabe que o embrião tem todo o programa genético.

Olhando para a legislação europeia, apenas a Irlanda e Portugal têm leis tão restritivas. Devemos continuar a penalizar as mulheres?

Tenho uma pena enorme dos comentários que dizem que é uma vergonha não termos uma lei tão aberta e permissiva... Isto leva-me ao futuro da Europa, que abdicou dos grandes valores. A Europa está em declínio e estas questões que foram introduzidas por uma cedência progressiva por via pragmática vão ter uma viragem inevitavelmente. Até que ponto se justifica criminalizar e levar à cadeia quem tenha feito um aborto? Ainda por cima sabendo que a Igreja tem o sacramento do perdão...A seguir ao 25 de Abril fui muitas vezes à televisão, umas vezes porque me pediam pessoalmente, outras porque o senhor cardeal Ribeiro me pedia. E numa mesa-redonda alguém me pôs essa questão. Disse nessa altura que se fosse possível separar a proibição ética do aborto da sua criminalização eu seria favorável a isso. Dois dias depois, um professor universitário meu amigo chamou-me e disse: "Você nunca diga uma coisa dessas em público porque para ser um ilícito tem de ter uma pena." E eu respondi-lhe: "Essa é uma questão de direito penal, então qual é a solução?" A solução é só de jurisprudência. O juiz tem de ter em conta as atenuantes e condenar ou não condenar.Essa argumentação é do direito. E a Igreja não se move apenas pela lei...Não nos metemos na questão de direito penal. A maior parte das mulheres que passa pela experiência do aborto precisa de ser ajudada e não condenada. E o apoio é mais social do que legal.

Uma nova legislação não pode combater o aborto clandestino?

Os dados que tenho mostram que a legalização do aborto aumenta o seu número. Há mulheres que não o fariam clandestinamente e que passariam a fazê-lo. Não está confirmado que diminuam, até porque é uma realidade que ninguém conhece.
O Parlamento decidiu por duas vezes fazer um estudo, mas nunca o fez. Saudei-o, mas nunca o fez.Se não fosse uma realidade gritante porque é que há esta preocupação cíclica de trazer o tema ao debate público?Porque há grupos de pressão muito grandes...
E também convicções...
Há muitos cidadãos que se sentem mal a abordar esta questão e por isso a abstenção vai ser fatal outra vez. Os nossos estudos mostram que a maior parte dos cidadãos sente-se mal a ter de se pronunciar sobre esta questão. É de outra ordem...

Até agora não o ouvimos utilizar a palavra "liberalização"...

Prefiro dizer que é uma legalização, não é uma simples despenalização. É uma lei que cria um direito cívico.
Criou-se a ideia de que teria feito um apelo à abstenção antes da reunião da Conferência Episcopal. E por isso fez um comunicado...Disse que o aborto não é uma questão religiosa, é de ética fundamental. Isso despertou muitas reacções, mesmo entre cristãos (recebi uma correspondência abundante), e só faltou acusarem-me de ser o promotor da lei... Por isso fiz um comunicado. Comecei por dizer que a doutrina da Igreja não mudou e não vai mudar, mas isso ninguém ouviu, nem os católicos mais exaltados me responderam. Sobre a abstenção perguntaram-me o que é que aconselhava a uma pessoa que estivesse com dúvidas. Disse que não aconselhava nada. Uma pessoa com dúvidas sobre uma questão tão fundamental certamente se abstinha. Há gente com muitas dúvidas. Uma pessoa que está disposta a votar "sim" e que tem dúvidas, se não é capaz de votar "não", pelo menos não arrisque.

Se o "sim" ganhar, mas o referendo não for vinculativo, deve o Parlamento legislar, como defende o ministro António Costa?

O senhor ministro fez uma comparação que não me parece completamente justa. Disse que da mesma maneira que da outra vez respeitaram o "não", se o "sim" ganhar com menos de 50% têm todo o direito de legislar. Em qualquer caso, têm o direito de legislar. Agora terão mais manobra política para o fazer se esse cenário se verificar.

Como é que observa o país do seu posto?

Com preocupação. Não sou um pessimista. Os pessimismos derrotistas só agravam os problemas. A minha preocupação não é económica. Há quem tenha de se preocupar com isso. A minha grande preocupação é cultural. Que legado estamos a deixar aos nossos vindouros? A civilização ocidental é contestada, de fora e de dentro. Há rupturas culturais muito sérias. Por exemplo, entre a Europa e os EUA, entre a Europa e a América Latina, uma não identificação com um certo laicismo à outrance...

E Portugal?
A comunidade portuguesa é muito débil em relação ao conjunto da Europa. Houve outras épocas da História em que com muito menos meios marcámos a história da humanidade.

Estamos em crise? Acabou a crise?

Essa era a crise económica? Isso não sei... Certamente acabou antes de começar. Penso que temos de nos preocupar com pessoas que no dia-a-dia sofrem...

Sente que há pessoas para quem a crise nunca acaba e outras para quem a crise nunca chega?

Quando vejo as estâncias balneares de todo o mundo cheias de portugueses, quando o Algarve se esgota para uma passagem de ano, quando estamos entre os 16 países mais ricos do mundo... Nestas férias visitei Angola, os bairros pobres aonde ninguém vai, até porque temos projectos de cooperação, e vim de lá siderado. Aquela gente não imagina o que é viver na Europa e nós não fazemos a mínima ideia do que é aquilo. São dois mundos que já não se conhecem, mas que acabarão por se influenciar...Entre nós, não ignora que há muitas manifestações na rua, muita gente descontente, um discurso de reformas mais ou menos generalizadas... É sinal de que estamos vivos.Em Junho de 2005, os bispos portugueses tomaram uma posição pública contra as medidas do Governo de então. Disseram que essas medidas "ameaçavam penalizar ainda mais aqueles que já são mais sacrificados".Quando estivermos convencidos disso temos a obrigação de o fazer.

Não estaremos numa situação similar?

Não é uma análise pormenorizada, mas tenho a sensação global de que o Governo da Nação tem feito um esforço por governar. Os governos democráticos são por natureza fracos porque estão muito dependentes das eleições que se seguem e das correntes de opinião. No nosso caso, tenho acompanhado com interesse a determinação em governar, em estudar os problemas e fazer reformas estruturais. É normal que quem se lança neste caminho, sei-o por experiência noutros sectores, corre o risco de não acertar sempre. Mas tenho visto com simpatia a determinação em governar, em tomar decisões, em não ficar dependente da plateia e do que pode acontecer amanhã em termos de opinião pública. Não quero com isto dar uma bênção total, até porque não estou capacitado para o fazer.

Comentários:
Se o aborto fosse livre, e infelizmente não é, não tínhamos de aturar os fascistas, neo-nazis, neo-salazaristas, padralhada, etc.
Muitos deles não teriam nascido, e viveríamos num mundo melhor.
Mas o aborto não é livre, infelizmente.
A asneira, pelo contrário, é livre. Infelizmente.
E sim, Abrantes, tu estás metido no enrolo de merda.
 
O PNR é só para meia dúzia de betos sai enquanto é tempo ó Abrantes.
 
se fosse so para meia duzia , nao vinhas aqui fazer rir ! acorda , estamos a ganhar-vos terreno ! saudaçoes nacionalistas .
 
Isto é só gente destemida. E para além disso, democratas: "Se o aborto fosse livre, e infelizmente não é, não tínhamos de aturar os fascistas, neo-nazis,(...)
Muitos deles não teriam nascido, e viveríamos num mundo melhor."

Enfim, o que é que vos distingue desses que tanto vos atormentam?

Não sejam ridículos e, ao menos, identifiquem-se
 
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